Perspectiva Salesiana
Nossa reflexão
salesiana para este domingo, festa da Assunção, foi tirada em sua totalidade do
Tratado do Amor de Deus, Livro 7, capítulo 14, de São Francisco de Sales.
"Eu não
afirmo, Teótimo, que na alma da Virgem Santíssima não houvesse duas correntes
e, por consequência, dois desejos: um conforme ao espírito e à razão superior,
outro, segundo os sentidos e a razão inferior, de modo que podia sentir
repugnâncias e oposições entre os dois; o mesmo se deu até em Nosso Senhor, seu
divino Filho. Mas e que eu digo é que nesta Mãe celeste, todos os afetos
estavam tão bem dispostos e ordenados que o divino amor exercia nela o seu
império e domínio com toda a suavidade, sem que a perturbassem desencontrados
desejos e apetites, nem oposições de sentimentos. Nem as revoltas do apetite
natural, nem os movimentos dos sentidos atingiram jamais em Maria o caráter de
pecado venial que fosse; pelo contrário, tudo redundava santa e fielmente em
serviço do amor divino pelo exercício de outras virtudes, cuja prática,
ordinariamente, é para nós cheia de dificuldades, repugnâncias e
contradições".
"O ímã,
como toda a gente sabe, atrai a si o ferro, em virtude duma propriedade que
tem, digna de admiração; no entanto há cinco coisas que impedem essa operação:
1ª - a grande distância; 2ª - se se interpuser um diamante; 3ª - se o ferro
estiver engordurado; 4ª - se o esfregarem com alho; 5ª - se o ferro estiver
muito pesado".
"Ora o
nosso coração foi feito para Deus, que o acarinha de contínuo e não deixa de derramar
nele os atrativos do seu celeste amor; mas cinco coisas impedem também que se
efetue esta atração: 1ª - o pecado, que nos afasta de Deus; 2ª - o amor às
riquezas; 3ª - os prazeres sensuais; 4ª - o orgulho e a vaidade; 5ª - o amor
próprio, com todo o seu cortejo de paixões desenfreadas e que em nós atingem um
peso esmagador".
"Ora,
nenhum destes impedimentos pôde jamais ter lugar no coração da Santíssima Virgem:
1º - sempre preservada de todo o pecado; 2º - sempre pobre no seu coração; 3º
sempre puríssima; 4º - sempre humilde; 56º - sempre dominadora de todas as
paixões e isenta de rebelião que o amor próprio opõe ao amor de Deus. É por
isso que, assim como o ferro, desembaraçado de todos os obstáculos e aliviado
do próprio peso, seria atraido forte mas docemente para o imã, de modo que a
atração seria tanto mais forte quanto mais perto se encontrassem um do outro,
assim também a Mãe Santíssima, não tendo em si nada que obstasse à operação do
divino amor do seu Filho, unia-se a Ele numa união incomparável em doces,
suaves e naturais êxtases. Nestas a parte sensível deixava de ter o seu
quinhão, sem, contudo, prejudicar a união do espírito; nem a aplicação do seu
espírito provocava grande desvio dos sentidos."
"Foi pois,
a morte da Virgem a mais doce que pode imaginar-se; atraída por Jesus com o
suave aroma de seus perfumes, lançou-se amorosamente, enlevada na fragrância
suavíssima desses aromas, no seio da bondade do seu Filho. E posto que esta
santa alma amasse com extremos de ternura o seu santíssimo, puríssimo e
amabilíssimo corpo, deixou-o todavia sem custo nem resistência alguma... o amor
dera aos pés da cruz a esta divina esposa as supremas dores da morte; justo era
que no fim de sua existência lhe concedesse as soberanas delícias do
amor."
Padre Michael
S. Murray, OSFS é diretor sênior da De Sales Centro de
Espiritualidade.
Tradução: P. Tarcizio Paulo Odelli - SDB
DOS ESCRITOS DE SÃO FRANCISCO DE SALES
15 de agosto
marca a celebração da festa da Assunção de Maria, o momento em que ela é elevada
às alturas. São Francisco de Sales observa que, com sua sinceridade e sua plena
confiança na vontade de Deus, Maria contribuiu para mudar a face da terra:
... Como o amor
de uma mãe é, de todos os tipos de amor, o mais intenso porque ele é um amor
incansável e insaciável, como foi no coração de uma mãe como ela, no coração de
um filho como ele? (TLG 03:08 183)
... Mesmo esta
Virgem santa sucumbiu ao sono... sim... esta celeste Rainha nunca dormia, exceto
por amor. Ela permitiu que seu corpo sagrado descansasse, apenas para
recuperar suas forças e poder servir melhor a Deus. Este é, sem dúvida, um
ato sublime da caridade. Como disse o grande Santo Agostinho, "a
caridade impõe a obrigação de amar os nossos corpos adequadamente, uma vez que
estes são essenciais para a realização de boas obras, fazem parte do nosso ser,
e também compartilharão a felicidade eterna. Certamente, o cristão deve
amar seu corpo como a imagem da encarnação do Salvador, já que nós somos descendentes
de uma mesma linhagem, e, consequentemente, pertencemos a ele no parentesco e
sangue. (TLG 03:08 183)
Quanto à
Santíssima Virgem, por Deus! Com que devoção deve ter amado seu corpo virginal,
não só porque o corpo era gentil, humilde, puro, obediente ao amor sagrado,
porque era totalmente ungido de mil maneiras sagradas com um bálsamo perfumado,
mas também porque era a fonte da vida do corpo do nosso Salvador, e pertencia a
ele da forma mais estrita e com uma intimidade incomparável. Por esta
razão, quando ela deu a seu corpo angelical um descanso, através do sono, costumava
dizer: "Descanse agora, Arca da Aliança, veleiro da santidade, o trono do
Altíssimo. Descansar por um pouco e, assim, suave e silenciosamente, mais
uma vez recuperou a sua força."( 03:08 TLG 184)
Que conversas teve
com seu filho amado! Que doce recompensa terá recebido em todos os
sentidos! (TLG 185 03:08)
Por que deveríamos
admirá-la, exceto ela, por quem e para quem Deus deu mais graça do que deu, e
nunca dará ao resto de suas criaturas? (03:08, 185)
Quando nossa
mente se eleva acima da luz natural da razão, e começa a vislumbrar a verdade
sagrada da fé.... Que alegria resulta! A alma se derrete com prazer ao
ouvir a voz do esposo celeste, já que o encontra mais doce que o mel e
delicioso de todas as ciências humanas. Deus deixou a sua marca, os sinais
da sua passagem, as suas pegadas, plasmadas em tudo o que foi criado. É
por isso que se basearmos nossa compreensão da majestade divina no que podemos
ver através das criaturas, parece que só podemos vislumbrar seus pés. Em
comparação, se observarmos por meio da fé, vamos ver a própria face da
majestade divina. (TLG 03:09, 187)
Purifiquemos todas
as nossas intenções tanto quanto pudermos. Consideremos todos os motivos
possíveis para o quais devemos realizar o trabalho confiado a nós, para que
possamos escolher como um amor sagrado o amor mais excelente de todos. Irriguemos
todos os outros amores com o amor sagrado, para que possamos transformá-los e que
se convertam em motivos dispostos, aprovados, amados e queridos por Deus (TLG
11:14, 237).
... Certamente
no momento da Assunção da Santa Mãe, o Salvador e todos os anjos se alegraram...
e esta não foi, por acaso a mais bela e magnífica de todas as chegadas que o
céu já viu, superada apenas pelo de seu Filho? Ela vem do deserto como uma
coluna de fumaça, carregada de mirra, incenso, levando o perfume exótico de
cada partícula (Fiorelli, Sermões 2:16).
Devem saber
que, no que diz respeito às boas obras, nesta vida ninguém começou a trabalhar
com elas tão cedo, nem perseverou tão diligentemente, como o fez Nossa Senhora. Nós
demoramos muito, e até mesmo, se fizermos boas obras muitas vezes as desperdiçamos
por causa do pecado e da nossa inconsistência. É por isso que a soma de
nossa boa quantidade de nossas boas obras não sobe muito... e se por meio da penitência
retornamos a graça, não percebemos que podemos gerenciar nossos assuntos de uma
forma ruim, pois perdemos muito tempo (Sermões 2:17).
O pecado venial
mancha nossas obras, retarda nosso progresso e impede o nosso progresso. Só
nossa santa senhora estava cheia de graça, desde a concepção (Sermões,
02:17)
... O prazer a
transborda, como neste mundo tinha sido tão rica em boas obras e trabalhos! Foi
elevada à mais alta glória dos santos (Sermões, 02:17)
... Deus,
através da Sua Divina Providência, com a determinação de estabelecer o mundo
espiritual da sua Igreja, colocou sobre esta, como abóboda divina do Céu, dois
grandes luminares: uma luz muito brilhante, a outra mais suave. A mais
brilhante é o Seu Filho Jesus Cristo... a fonte de toda a glória, o verdadeiro
Sol de Justiça. A luz mais tênue é a Santa Mãe de seu grande filho...
(Sermões, 02:02)
... Ele
iluminou o povo da Igreja com a luz de seus milagres, com seu exemplo, seus ensinamentos
e suas santas palavras!... (Sermões 02:03)
As cegonhas demonstram
uma devoção filial por seus pais e mães. Quando os pais envelhecem... e com
a dureza das estações e do tempo, são forçados a migrar para buscar refúgio em
um lugar mais quente, os jovens levam seus pais, assumindo suas cargas, para,
de alguma forma possam corresponder aos benefícios recebidos deles durante a
reprodução. Nosso Senhor teve o seu corpo do corpo de sua Mãe. Ela o levou
por muito tempo em seu ventre sagrado e em seus castos braços... Senhor, Tu
ordenastes que os filhos ajudassem os pais na velhice. Esta lei está tão arraigada
na natureza que até as cegonhas a cumprem... Que filho, se possível, não elevaria
sua mãe para o paraíso após a morte? A Mãe de Deus morreu por amor, e o
amor de seu Filho a ressuscitou.
... Devemos limpar
nossas obras e nossos afetos para poder purificá-los, moldá-los e ajustá-los de
acordo com a lei do Evangelho. Se fizermos isso, não podemos comprometer-nos
com obrigações nem sacrifícios, e muito menos podemos ser salvos a menos que
acreditemos [Mlk16: 16] na doutrina cristã, e que nos eduquemos de acordo com
ela. É assim que aprendemos quais são coisas que devemos crer, o que
devemos pedir e o que podemos esperar (Sermões 2: 18).
Toda a sua
perfeição, todas as suas virtudes, toda a sua felicidade, são referência, consagradas
e dedicadas a glória de Seu Filho, que é sua fonte, seu autor, que deu os
toques finais [Heb 0:02 Douay.].... Tudo volta a este ponto (Sermões 2:
18).
Ao invés disso,
a honra concedida a Mãe, em referência ao Filho, faz com que a glória da Sua
Misericórdia seja magnífica e ilustre (Sermões 2:190).
Certamente
chegará um dia em que ressuscitaremos dos mortos, e esses corpos mortais que temos
agora, sujeitos à corrupção, serão imortais [1Co 15:51-54.], completamente espirituais,
e reconstruídos como o de Nosso Senhor [Phil.3: 21]. (Sermões 2:119)
O Filho, que ao
chegar ao mundo recebeu Seu corpo e Sua carne de sua Mãe, não queria que Ela
ficasse aqui embaixo, nem no corpo ou na alma. Pouco tempo depois que ela pagou
a sentença universal da morte, Ele mesmo se encarregou de levá-la para o reino
de seu santo Paraíso. A Igreja é testemunha deste fato e o chama de festa da "Assunção",
e baseia-se na mesma tradição pela qual se assegura a igreja sobre a morte de Maria
e sua ressurreição (Sermões, 2:15).
Nosso Senhor
recebeu Seu corpo do corpo de sua mãe. Ela o levou por muito tempo em seu ventre
sagrado, e o levou em seus castos braços, quando, por causa da perseguição, foi
necessário migrar para o Egito (Sermões 2:15).
(Adaptado a partir dos escritos de São Francisco
de Sales)