domingo, 6 de abril de 2014

Perspectivas Salesianas 25 - Hospitalidade divina


Certo dia a campainha da nossa porta tocou. Eu olhei e vi que era um homem que nos tinha enganado no passado. Eu achava muito difícil tratar com ele. Não queria abrir a porta porque eu não sabia o que dizer. Minha irmã Margarida me sugeriu que dissesse: "Olá Jesus".
Eu sabia que ela estava certa. Rezei para que a fé me permitisse receber Jesus encarnado naquela pessoa. Talvez este homem ignorasse sua união com Jesus e pessoalmente não poderia agir de outra forma, mas alguém tinha que fazê-lo ver.
Se não via Jesus nele, quem poderia?
Havia uma irmã da Ordem da Visitação em São Luis que tinha tido uma babá quando era pequena, chamada Lulu. Anos mais tarde, quando fui visitar Lulu numa casa de repouso, a irmã lhe recordou como tinha sido difícil sua infância. A anciã Lulu lhe respondeu: "Ah, sim, mas eu também te amei como se você tivesse se comportado como uma boa menina".
Uma coisa é acolher pessoas que gostamos. Mas é completamente diferente dar as boas vindas para aqueles que nos parecem antipáticos.
Jesus é o modelo de hospitalidade: "Vinde a mim todos os que estão com fome e encontrareis descanso." Jesus não está necessariamente oferecendo comida, mas algo a mais. O pão que é Ele mesmo. Jesus oferece hospitalidade quando convém e quando não convém. Jesus oferece hospitalidade tanto para os pecadores, como para os santos, para seus amigos e para seus inimigos.
O sentido de companheirismo de Jesus foi uma das marcas do seu ministério, e isso escandalizou a muitos, porque Ele comia com publicanos e pecadores. Ele era INCLUSIVO. Apesar de tudo, Deus faz chover tanto sobre o bom tanto quanto sobre o mau.
"Se alguém disser: Amo a Deus, mas odeia seu irmão, é mentiroso. Porque aquele que não ama seu irmão, a quem vê, é incapaz de amar a Deus, a quem não vê. (1 Jo 4, 20). Poderíamos  acrescentar: "se alguém não acolhe seu próximo a quem vê, como pode clamar ser acolhido por Deus a quem não vê?"
"Faça a tua casa em mim, como eu faço a minha em ti" é uma declaração surpreendente de Jesus sobre a RECIPROCIDADE de ser hospitaleiro para com Deus e Deus conosco. Jesus está batendo na porta  de nossos corações: abrimos nossos corações ao Seu?
Jesus nos diz que devemos ter o mesmo tipo de hospitalidade mútuo, dizendo-nos que acolhendo os outros, estamos acolhendo a Ele. "Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes" (Mateus 25, 40)
O mistério da visitação é um modelo daquilo que cada um de nós deveria ser. Maria, depois de escutar a mensagem do anjo, a aceitou com fé e preparou um lugar em seu ser para esta pessoa inesperada a quem ela daria sua carne e sangue como alimento. Ela meditou (hospitalidade contemplativa) enquanto foi visitar sua prima Isabel. Esta reunião abençoada de receber e ser recebida, de administrar e ser administrada, parece ser mútua. Neste mesmo sentido, o mistério da visitação é um símbolo da igreja e do seu ministério no reino de Deus. Trata-se de dar espaço para os mais necessitados, aos inesperados, alimentando-os com o corpo e sangue de Jesus. De estender a mão aos outros com amor mútuo e juntos louvando a Deus, exigindo uns dos outros a praticar a justiça.
A hospitalidade começa em casa. Devemos ser amáveis e aceitar a nós mesmos, sendo amigáveis com aquelas partes que nós não gostamos no nosso corpo e aprender a respeitar-nos por aquilo que somos: filhos amados de Deus.
Para chegar ao ponto de focar e expressar esse espírito acolhedor do Deus vivo em relação conosco e com os outros, vivemos naquilo que é conhecido na tradição salesiana como o "ponto culminante de nossa alma." Somos chamados a viver no ponto culminante de nossa alma e espírito, amando e acolhendo, apesar daquilo que podemos sentir sobre os outros, ou até conosco mesmos e em qualquer momento.
  A hospitalidade está envolvida na obra de um Deus que muitas vezes não é visto ou sentido.
A inconstância de nossas almas é movida por ventos de paixão e, portanto, são sempre instáveis. Mas temos sempre a liberdade e o poder disponíveis através da graça de Deus, para acolher os outros afetiva e abertamente, sem levar em consideração como nos sentimos a respeito deles. Isso é precisamente viver "em Jesus".
Devemos estar conscientes de nossa superioridade assumida, a acreditar que a nossa própria maneira de sentir, pensar e agir é sempre correta (e que é a única maneira!) e que os modos de ser dos outros parecem bobagens, comuns, e irracionais. Devemos deixar de lado camada após camada de superficialidade (nossos títulos, entretenimentos, cargos, funções na sociedade, raça, cultura, etc) para entrar mais profundamente no coração da nossa própria existência. Aqui podemos verdadeiramente dizer: "Já não sou eu quem vive, mas é Cristo que vive em mim."
A Espiritualidade salesiana está relacionada com isto. O que existe entre as pessoas é a essência de fazer viver Jesus. Alguém encontra Deus precisamente com as pessoas e através delas. Portanto, a hospitalidade não é fazer algo bonito ou extraordinário pelos outros. É, de fato, uma forma concreta de prática da paz e da justiça do Deus Uno e Trino, e mostrar algo divino em nosso ato de boas vindas aos outros.
Cada um de nós é a encarnação de Deus. Jesus nos ensina como praticar a hospitalidade. Ao ressuscitar tomou várias aparências: um jardineiro, um peregrino, um pescador. Hoje, vemos sua presença ressuscitada um bilhão de vezes. Damos boas-vindas a Jesus hoje como um homem, uma mulher, uma pessoa idosa, um jovem, um político, um empreendedor, uma pessoa sem-teto, um atleta, introvertido ou extrovertido, um chato, um cego ou deficiente mental, casado, divorciado, gay ou lésbica, preso, viciado,pobre, rico, educado, ignorante, preto, branco? Cada um é um ser vivo vivendo interiormente uma aparência exterior. Dê boas-vindas a cada um e diga: "Oi, Jesus!"
Lembre-se: hospitalidade divina é para todos... não apenas para alguns favoritos.

Para refletir:

1. Sou uma pessoa acolhedora?
2. Acolho a Deus em tudo na minha vida, e não apenas em parte dela?
3. Sou muito acolhedor com os outros?
4. Dou as boas-vindas somente para aquele que gosto?
5. Como recebo as pessoas que me são impertinentes, difíceis de tratar ou incômodas?
6. Neste momento, quais são as pessoas em minha vida que tem mais necessidade de serem acolhidas?
7. Agora mesmo, que aspectos da minha vida mais precisam de hospitalidade?
8. Quando aceito a hospitalidade dos outros, sou amigável?

Para rezar:

“Meu Deus, eu te entrego esta ação. Concede-me a graça de realizá-la da melhor maneira possível aos teus olhos. Desde já te ofereço todo bem que eu possa fazer. Que eu aceite qualquer dificuldade que possa encontrar no meu caminho.”

Textos bíblicos

1 Tm 3, 1-2
1 Eis uma coisa certa: quem aspira ao episcopado, saiba que está desejando uma função sublime. 2 Porque o bispo tem o dever de ser irrepreensível, casado uma só vez, sóbrio, prudente, regrado no seu proceder, hospitaleiro, capaz de ensinar.
Tt 1, 8-9

8 Ao contrário, seja hospitaleiro, amigo do bem, prudente, justo, piedoso, continente, 9 firmemente apegado à doutrina da fé tal como foi ensinada, para poder exortar segundo a sã doutrina e rebater os que a contradizem.

Rm 12, 9-13

9 Que vossa caridade não seja fingida. Aborrecei o mal, apegai-vos solidamente ao bem. 10 Amai-vos mutuamente com afeição terna e fraternal. Adiantai-vos em honrar uns aos outros. 11 Não relaxeis o vosso zelo. Sede fervorosos de espírito. Servi ao Senhor. 12 Sede alegres na esperança, pacientes na tribulação e perseverantes na oração.
13 Socorrei às necessidades dos fiéis. Esmerai-vos na prática da hospitalidade.

1 Pd 4, 7-11

7 O fim de todas as coisas está próximo. Sede, portanto, prudentes e vigiai na oração. 8 Antes de tudo, mantende entre vós uma ardente caridade, porque a caridade cobre a multidão dos pecados (Pr 10,12). 9 Exercei a hospitalidade uns para com os outros, sem murmuração. 10 Como bons dispensadores das diversas graças de Deus, cada um de vós ponha à disposição dos outros o dom que recebeu: 11 a palavra, para anunciar as mensagens de Deus; um ministério, para exercê-lo com uma força divina, a fim de que em todas as coisas Deus seja glorificado por Jesus Cristo. A ele seja dada a glória e o poder por toda a eternidade! Amém.

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