Certo dia a campainha da nossa
porta tocou. Eu olhei e vi que era um homem que nos tinha enganado no passado.
Eu achava muito difícil tratar com ele. Não queria abrir a porta porque eu não
sabia o que dizer. Minha irmã Margarida me sugeriu que dissesse: "Olá
Jesus".
Eu sabia que ela estava certa.
Rezei para que a fé me permitisse receber Jesus encarnado naquela pessoa.
Talvez este homem ignorasse sua união com Jesus e pessoalmente não poderia agir
de outra forma, mas alguém tinha que fazê-lo ver.
Se não via Jesus nele, quem
poderia?
Havia uma irmã da Ordem da Visitação
em São Luis que tinha tido uma babá quando era pequena, chamada Lulu. Anos mais
tarde, quando fui visitar Lulu numa casa de repouso, a irmã lhe recordou como
tinha sido difícil sua infância. A anciã Lulu lhe respondeu: "Ah, sim, mas
eu também te amei como se você tivesse se comportado como uma boa menina".
Uma coisa é acolher pessoas que gostamos.
Mas é completamente diferente dar as boas vindas para aqueles que nos parecem
antipáticos.
Jesus é o modelo de hospitalidade:
"Vinde a mim todos os que estão com fome e encontrareis descanso." Jesus
não está necessariamente oferecendo comida, mas algo a mais. O pão que é Ele mesmo.
Jesus oferece hospitalidade quando convém e quando não convém. Jesus oferece hospitalidade
tanto para os pecadores, como para os santos, para seus amigos e para seus
inimigos.
O sentido de companheirismo de
Jesus foi uma das marcas do seu ministério, e isso escandalizou a muitos,
porque Ele comia com publicanos e pecadores. Ele era INCLUSIVO. Apesar de tudo,
Deus faz chover tanto sobre o bom tanto quanto sobre o mau.
"Se alguém disser: Amo a
Deus, mas odeia seu irmão, é mentiroso. Porque aquele que não ama seu irmão, a
quem vê, é incapaz de amar a Deus, a quem não vê. (1 Jo 4, 20). Poderíamos acrescentar:
"se alguém não acolhe seu próximo a quem vê, como pode clamar ser acolhido
por Deus a quem não vê?"
"Faça a tua casa em mim,
como eu faço a minha em ti" é uma declaração surpreendente de Jesus sobre a
RECIPROCIDADE de ser hospitaleiro para com Deus e Deus conosco. Jesus está
batendo na porta de nossos corações: abrimos nossos corações ao Seu?
Jesus nos diz que devemos ter o
mesmo tipo de hospitalidade mútuo, dizendo-nos que acolhendo os outros, estamos
acolhendo a Ele. "Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que fizestes
isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes"
(Mateus 25, 40)
O mistério da visitação é um
modelo daquilo que cada um de nós deveria ser. Maria, depois de escutar a
mensagem do anjo, a aceitou com fé e preparou um lugar em seu ser para esta
pessoa inesperada a quem ela daria sua carne e sangue como alimento. Ela meditou
(hospitalidade contemplativa) enquanto foi visitar sua prima Isabel. Esta reunião
abençoada de receber e ser recebida, de administrar e ser administrada, parece ser
mútua. Neste mesmo sentido, o mistério da visitação é um símbolo da igreja e do
seu ministério no reino de Deus. Trata-se de dar espaço para os mais
necessitados, aos inesperados, alimentando-os com o corpo e sangue de Jesus. De
estender a mão aos outros com amor mútuo e juntos louvando a Deus, exigindo uns
dos outros a praticar a justiça.
A hospitalidade começa em casa.
Devemos ser amáveis e aceitar a nós mesmos, sendo amigáveis com aquelas partes que
nós não gostamos no nosso corpo e aprender a respeitar-nos por aquilo que
somos: filhos amados de Deus.
Para chegar ao ponto de focar e
expressar esse espírito acolhedor do Deus vivo em relação conosco e com os
outros, vivemos naquilo que é conhecido na tradição salesiana como o
"ponto culminante de nossa alma." Somos chamados a viver no ponto
culminante de nossa alma e espírito, amando e acolhendo, apesar daquilo que
podemos sentir sobre os outros, ou até conosco mesmos e em qualquer momento.
A hospitalidade está envolvida
na obra de um Deus que muitas vezes não é visto ou sentido.
A inconstância de nossas almas é
movida por ventos de paixão e, portanto, são sempre instáveis. Mas temos sempre
a liberdade e o poder disponíveis através da graça de Deus, para acolher os
outros afetiva e abertamente, sem levar em consideração como nos sentimos a
respeito deles. Isso é precisamente viver "em Jesus".
Devemos estar conscientes de
nossa superioridade assumida, a acreditar que a nossa própria maneira de
sentir, pensar e agir é sempre correta (e que é a única maneira!) e que os modos
de ser dos outros parecem bobagens, comuns, e irracionais. Devemos deixar de
lado camada após camada de superficialidade (nossos títulos, entretenimentos, cargos,
funções na sociedade, raça, cultura, etc) para entrar mais profundamente no
coração da nossa própria existência. Aqui podemos verdadeiramente dizer: "Já
não sou eu quem vive, mas é Cristo que vive em mim."
A Espiritualidade salesiana está
relacionada com isto. O que existe entre as pessoas é a essência de fazer
viver Jesus. Alguém encontra Deus precisamente com as pessoas e através delas.
Portanto, a hospitalidade não é fazer algo bonito ou extraordinário pelos
outros. É, de fato, uma forma concreta de prática da paz e da justiça do Deus
Uno e Trino, e mostrar algo divino em nosso ato de boas vindas aos outros.
Cada um de nós é a encarnação de
Deus. Jesus nos ensina como praticar a hospitalidade. Ao ressuscitar tomou
várias aparências: um jardineiro, um peregrino, um pescador. Hoje, vemos sua
presença ressuscitada um bilhão de vezes. Damos boas-vindas a Jesus hoje
como um homem, uma mulher, uma pessoa idosa, um jovem, um político, um
empreendedor, uma pessoa sem-teto, um atleta, introvertido ou
extrovertido, um chato, um cego ou deficiente mental, casado, divorciado, gay
ou lésbica, preso, viciado,pobre, rico, educado, ignorante, preto, branco? Cada
um é um ser vivo vivendo interiormente uma aparência exterior. Dê boas-vindas a
cada um e diga: "Oi, Jesus!"
Lembre-se: hospitalidade divina é
para todos... não apenas para alguns favoritos.
Para refletir:
1. Sou uma pessoa acolhedora?
2. Acolho a Deus em tudo na minha
vida, e não apenas em parte dela?
3. Sou muito acolhedor com os
outros?
4. Dou as boas-vindas somente
para aquele que gosto?
5. Como recebo as pessoas que me
são impertinentes, difíceis de tratar ou incômodas?
6. Neste momento, quais são as pessoas
em minha vida que tem mais necessidade de serem acolhidas?
7. Agora mesmo, que aspectos da
minha vida mais precisam de hospitalidade?
8. Quando aceito a hospitalidade
dos outros, sou amigável?
Para rezar:
“Meu Deus, eu te entrego esta ação. Concede-me a
graça de realizá-la da melhor maneira possível aos teus olhos. Desde já te
ofereço todo bem que eu possa fazer. Que eu aceite qualquer dificuldade que
possa encontrar no meu caminho.”
Textos
bíblicos
1 Tm 3, 1-2
1 Eis uma coisa certa: quem
aspira ao episcopado, saiba que está desejando uma função sublime. 2 Porque o bispo tem o dever de
ser irrepreensível, casado uma só vez, sóbrio, prudente, regrado no seu
proceder, hospitaleiro, capaz de ensinar.
Tt 1, 8-9
8 Ao
contrário, seja hospitaleiro, amigo do bem, prudente, justo, piedoso,
continente, 9 firmemente apegado à doutrina da fé tal como foi
ensinada, para poder exortar segundo a sã doutrina e rebater os que a
contradizem.
Rm 12, 9-13
9
Que vossa caridade não seja fingida. Aborrecei o mal, apegai-vos solidamente ao
bem. 10 Amai-vos mutuamente com afeição terna e fraternal.
Adiantai-vos em honrar uns aos outros. 11 Não relaxeis o vosso zelo.
Sede fervorosos de espírito. Servi ao Senhor. 12 Sede alegres na
esperança, pacientes na tribulação e perseverantes na oração.
13
Socorrei às necessidades dos fiéis. Esmerai-vos na prática da hospitalidade.
1 Pd 4, 7-11
7 O
fim de todas as coisas está próximo. Sede, portanto, prudentes e vigiai na
oração. 8 Antes de tudo, mantende entre vós uma ardente caridade,
porque a caridade cobre a multidão dos pecados (Pr 10,12). 9 Exercei
a hospitalidade uns para com os outros, sem murmuração. 10 Como bons
dispensadores das diversas graças de Deus, cada um de vós ponha à disposição
dos outros o dom que recebeu: 11 a palavra, para anunciar as
mensagens de Deus; um ministério, para exercê-lo com uma força divina, a fim de
que em todas as coisas Deus seja glorificado por Jesus Cristo. A ele seja dada
a glória e o poder por toda a eternidade! Amém.
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