Fotografia: Tarcizio Paulo Odelli
Nesta semana estou participando dos Exercícios Espirituais em
Florianópolis, no Recanto Champagnat. Andando no meio desta exuberante
natureza, lembrei-me de uma frase que S. Francisco de Sales escreveu em outubro
de 1606 para Joana de Chantal: “[Deus] o encontrei cheio de doçura e suavidade
entre as nossas mais altas e ásperas montanhas, onde muitas almas simples o
amavam e adoravam em toda a verdade e sinceridade”. Aqui não estamos nas altas
montanhas, mas olhando estas lindas paisagens só poderemos dizer a mesma coisa:
encontrei Deus aqui, na Lagoa da Conceição em Florianópolis. (Clique na foto para aumentar e ver a beleza do lugar)
Na leitura de hoje Jesus nos diz
que devemos ser servos bons e fiéis que se preocupam pela lei e pelas pessoas que
são de Deus. São Francisco de Sales nos oferece as seguintes reflexões sobre
este assunto.
A única coisa que Nosso Senhor
deseja é que a nossa disposição para aceitar a vontade de Deus seja total.
Quando acolhemos a vontade de Deus, estamos consagrando nossos corações ao amor
de Deus. Então desejamos servi-lo fielmente, tanto nas pequenas tarefas como
nas grandes. As moscas não são incomodas por sua força, mas pelo fato de serem
muitas. Assim acontece que às vezes as tarefas insignificantes se tornam mais
trabalhosas do que as tarefas importantes. Mesmo quando devemos colocar nossa
atenção nas tarefas que Deus nos propôs, não devemos deixar que estas tarefas
se convertam numa preocupação. A preocupação entorpece nossa habilidade para
raciocinar e turba nosso bom juízo. Portanto, e sem pressa, tratem de cumprir suas
obrigações com calma e ordem, uma depois da outra. Organizem tudo aquilo que
devem fazer hoje, com tranquilidade mental. Amanhã se dedicarão a organizar
outras coisas.
A ansiedade equivale ao desejo de
escapar de um mal existente ou de adquirir um bem desejado. Quando não obtemos
êxito que esperamos nos enchemos de ansiedade e impaciência. Não existe nada
que obstrua nosso progresso no caminho do amor sagrado como a ansiedade. É por
isso que devemos ser muito cuidadosos e assegurar-nos de que nosso coração esteja
aberto e disposto a ceder diante do amor de Deus. Quando permitimos que o amor
divino seja aquele que governa todos os nossos atos, não estamos demonstrando
menos amor do que quando estamos orando. Tanto nossos trabalhos como nosso
descanso louvam e servem a Deus com regozijo. Então, nossas tarefas diárias
brilham como se fossem obra da santidade. Por um só copo de água nosso Salvador
prometeu um oceano de plenitude perfeita para todos seus fiéis.
Quando fazemos pequenos atos de
caridade no dia a dia e aceitamos todas as pequenas provas que nos impõe cada
dia, demonstramos que estamos dispostos a receber a vontade de Deus. Estas
oportunidades aparecem de vez em quando. Concluir pequenas obras, com a intenção
totalmente pura de comprazer a Deus, é fazê-las de maneira excelente. Então,
nossas obras diárias incrementam o amor divino, porque vivemos em Jesus que nos
ensina como ser bons servos fiéis a Deus.
(Adaptado dos escritos de São
Francisco de Sales)
Perspectiva Salesiana
Destaque: “Por isso deveis fazer
e obsevar tudo o que eles dizem. Mas não imiteis suas ações!”
No Evangelho de hoje Jesus diz a
seus ouvintes que devem fazer tudo o que os escribas e os fariseus dizem, mas,
ao mesmo temo os adverte sobre as consequências de seguir seu exemplo: “Suas palavras
são muito valiosas, mas seus atos são muito poucos”.
Por que esta inconsistência? Por
que esta desconexão? Por que a incongruência entre o que pregavam e o que
faziam? Por que tantas palavras bonitas, mas poucos fatos?
Talvez, como nos diz o Profeta
Malaquias em seu livro, eles não conseguiram “semear em seus corações”. O que
não semearam? A lei do amor de Deus: a lei que nos desafia a exaltar a Deus
promovendo a justiça e a paz por meio de nossos relacionamentos com os outros.
Malaquias nos diz o seguinte: “Acaso
não é um só o pai de todos nós? Acaso não fomos criados por um único Deus? Por
que então perdemos a fé uns nos outros? Como disse São Francisco de Sales, “Por
que em nosso relacionamento com o próximo empregamos “dois corações”? Ensinamos
a um coração ser sumamente tolerante para conosco mesmos, mas hospedamos outro,
que é demasiado duro com os outros”.
Este é o perigo que corremos
quando permitimos que nosso conhecimento de Deus resida exclusivamente em
nossas cabeças e não em nossos corações. Na medida em que nossa fé continue a
ser intelectual ou teórica, jamais poderá responder nem aceitar as
necessidades, as esperanças, os medos, nem os sonhos dos outros. Na medida em
que não assimilamos realmente, no profundo dos nossos corações o amor de Deus
por nós, permaneceremos imutáveis diante das necessidades ou calamidades que
acontecem aos outros.
Aqui está a essência da crítica
que Jesus faz aos escribas e aos fariseus: “Eles amarram pesados fardos e os
colocam nos ombros dos outros, mas eles mesmos não estão dispostos a movê-los
nem sequer com um dedo”. Como não souberam acolher a Lei de Moisés – e a lei de
Jesus – em seus corações, preferem impor as cargas mais pesadas aos outros para
que sejam eles que as levem em seus ombros e em seus corações.
Manter a fé uns nos outros requer
primeiramente que permitamos que o amor criativo, redentor e inspirador de Deus
penetre em nossos corações. Devemos assumir com seriedade nossa necessidade
constante de conversão, de reconciliação e transformação. Devemos assumir
seriamente o fato de que o amor de Deus por nós não deve ficar em nós: deve ser
partilhado com os outros.
“Acaso não é um só o pai de todos
nós? Acaso não fomos criados por um único Deus?” Então devemos ter fé uns nos
outros. Devemos ser promotores da saúde, da felicidade e da santidade entre
nós. Devemos buscar a paz e a justiça entre nós. Devemos prometer a
reconciliação e a colaboração entre nós. Resumindo: nossas ações devem
ultrapassar ou ao menos estar no nível de nossas palavras. Dito de outra
maneira, quando nós acolhemos o coração de Jesus em nosso coração, não existe
espaço para a parcialidade: ou amamos nosso próximo como a nós mesmos... ou
não.
Texto: Padre Michael S. Murray, OSFS é o Diretor do Centro
Espiritual de Sales.
Tradução do espanhol: P. Tarcizio Paulo Odelli - SDB